quinta-feira, 29 de março de 2012

Bifosfonados x Osteonecrose






A Associação Americana de Endodontistas (AAE) divulgou recentemente, em sua reunião anual, um posicionamento sobre as implicações endodônticas do uso de bifosfonatos. O documento destacou sintomas de pacientes que apresentam a doença associada a esse tipo de droga, como ulceração mucosal irregular, dor ou inchamento na mandíbula afetada, infecção, possivelmente com purulência, ou sensação alterada, como dormência.

Mais do que isso, a AAE ainda recomendou que "Até que mais informações estejam disponíveis, seria prudente considerar todos os pacientes que tomam bifosfonatos como portadores de algum risco para osteonecrose associada à substância, com o reconhecimento de que a magnitude do risco provavelmente varia, dependendo do consumo individual da droga, fatores do paciente (interação medicamentosa, doenças etc.) e histórico de tratamento odontológico".

O que são os bifosfonados ?

Os bifosfonatos são drogas conhecidas desde a metade do século XIX, sendo que sua primeira síntese farmacêutica foi na Alemanha em 1865. São análogos sintéticos não-metabólicos dos pirofosfatos, compostos farmacológicos caracterizados pelo alto tropismo ao tecido ósseo com grande afinidade por cálcio e hidroxiapatita. Basicamente, agem no metabolismo ósseo pela inibição da proliferação dos osteoclastos.
Eles são amplamente usados e indicados para casos de pacientes com cânceres de mama e próstata, entre outros, em que é comum que aconteça a metástase óssea, assim como também são aplicados em casos de osteoporose.

Como é que essas substâncias agem?

Para entender essa atuação é preciso conhecer a reabsorção óssea, um processo natural em que o osso se recria cotidianamente. Nós temos células denominadas osteoblastos, que criam os ossos, e outras chamadas osteoclastos, responsáveis por sua absorção.
De maneira geral, o mecanismo de ação dos bifosfonatos é a inibição da reabsorção óssea. A sua ação antiosteoclástica é causada pela inibição ou irreversível morte celular dos osteoclastos. Os bifosfonatos unem-se rapidamente aos cristais de minerais presentes em cada estrutura óssea. As repetidas doses de bifosfonatos acumulam-se na matriz óssea. Assim, o osso para de ser reabsorvido.

O que é osteonecrose?

A osteonecrose dos maxilares, aquela sobre a qual a AAE se pronunciou, é definida como uma área de exposição óssea com mais de oito semanas de duração sem cicatrização espontânea. Essa doença pode necessitar tanto de um reparo prolongado sem dor quanto de uma condição seriamente dolorosa e debilitante que dura por muitos anos sem resolução.
Ela é causada pela deficiência de irrigação de sangue no interior do osso, o que causa a necrose do tecido. Seu diagnóstico é relativamente simples: dor, deficiência na cicatrização e infecções frequentes são exemplos de sintomas. Em uma extração, por exemplo, o tempo médio de melhora é de dois dias. Uma demora além desse tempo deve ser recebida como um sinal de alerta.

Existem algumas hipóteses de que o mecanismo pelo qual o bifosfonato comprometeria a vascularização óssea poderia estar relacionado com o seu efeito sobre os osteoclastos. Osteócitos mortos não são substituídos e o sistema capilar ósseo não é mantido, resultando em necrose vascular. Evitando a ação dos osteoclastos, com consequente cessação da atividade dos osteoblastos, o turnover (remodelamento) ósseo é reduzido ou interrompido. A redução do suprimento sanguíneo em áreas necróticas pode, também, ser correlacionada com as propriedades antiangiogênicas bem estabelecidas dos bifosfonatos. Nos ossos longos, essa ação tem o efeito desejado de, progressivamente, aumentar a densidade do osso osteoporótico. Com malignidade óssea, os bifosfonatos previnem a reabsorção óssea progressiva, reduzindo a extensão de metástase óssea e dor. Um efeito similar ocorre nos ossos maxilares, mas, como o remodelamento ósseo do osso alveolar é 10 vezes maior do que os ossos longos, há uma redução maior do turnover ósseo.

muitos pontos que devem ser levados em conta. Sabe-se que a osteonecrose ocorre muito mais quando essas drogas são aplicadas por meio injetável e após um longo tempo de uso. Entretanto, ainda carecemos de uma literatura mais completa sobre essa suposta relação. Pouco se fala sobre o contexto em que o bifosfonato é aplicado. Muitas vezes essa droga é inserida em associação a outros medicamentos em pacientes muito imunodeprimidos, que já passam por tratamentos agressivos como quimioterapia e radioterapia. Não é raro seu uso associado a corticosteroides, que também podem causar efeitos severos no organismo e na imunidade desses pacientes.

Como o cirurgião-dentista deve proceder nos casos onde o paciente utiliza essa medicação?

O que se discute muito hoje é se devemos operar pacientes em uso destes medicamentos e, caso optarmos por operá-los, se devemos suspender o uso dos bifosfonatos. De uma maneira geral, devemos lembrar que o cirurgião-dentista nunca deve suspender um medicamento que não foi prescrito por ele. Neste caso (pode ser bifosfonato, anticoagulante, medicamento para diabete ou qualquer outro), deve haver contato formal com resposta por escrito do médico que receitou o remédio, de maneira que estejamos protegidos no aspecto médico-legal e o paciente esteja seguro do tratamento em conjunto para melhor benefício deste. Nossa conduta tem sido não solicitar a suspensão dos bifosfonatos via oral para tratamentos odontológicos, independente do tempo em que o paciente vem usando o medicamento.

O profissional deve ficar atento aos fatores de risco que podem influenciar na osteonecrose, prestando atenção à idade do paciente, tempo de uso dos bifosfonatos, modo de utilização dessas drogas (injetável ou não) e a existência de traumas. O melhor a se fazer é evitar exposições sanguíneas muito longas, já que quanto mais extensa a cirurgia, maiores os riscos. Ainda na ocasião do procedimento cirúrgico, é fundamental um exame clínico detalhado, uma anamnese que valorize perguntas sobre o uso de algum bifosfonato e, quando necessário, uma cobertura antibiótica anterior à cirurgia.


Fonte : Revista Perionews
Prof. Dr. Angelo Menuci Neto, especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial e Implantodontia
Prof. Dr. Artur Cerri, diretor da Escola de Aperfeiçoamento Profissional da APCD

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